Majestade do Samba

PORTELA é FATO E FOCO



terça-feira, 23 de novembro de 2010

PORTELA - O milênio aqui a agora!

Tema da Portela, as oito metas da ONU para o mundo são realidade na área da escola de samba.  (O DIA - 11/2004)

Em ritmo de desenvolvimento humano, a criatividade de gente comum desfila, silenciosamente, idéias para transformar a realidade de comunidades pobres do Rio. A cadência de desafios cai como uma luva sobre as recomendações das Organizações das Nações Unidas (ONU) para reduzir a fome, a pobreza e o subdesenvolvimento até 2015. Tema que a Portela levará para a Marquês de Sapucaí ano que vem. O Carnaval das Oito Metas para Recriar a Criação vai convidar o planeta – e o Rio – à transformação.

Assim como já faz a Associação de Moradores e Amigos do Morro do Sapê (Amasa), em Vaz Lobo. Por lá, lugar de criança é na sala de aula e na quadra de esportes. Há dois anos e meio, o projeto Sonho de Ser Feliz vem recrutando meninos e meninas de todas as idades. “Nosso sonho é que eles possam lutar com igualdade no mercado de trabalho. Tomara que possamos servir de exemplo para a ONU”, sugere Sérgio Felipe de Jesus, 41 anos, presidente da Amasa. Evolução do ensino e igualdade entre os sexos são algumas das alegorias propostas pela ONU. Assim como redução da mortalidade infantil, melhoria da saúde materna, combate a doenças como AIDS e respeito à natureza.

Atualmente, no Sapê, 60 crianças entre 5 e 15 anos participam das aulas de reforço da professora Ana Cláudia Roque, 33. Moradora da comunidade, ela recebe R$ 200 por mês. “Tivemos que abrir mão da outra professora. Era ela ou leite do lanche”, lamenta Sérgio. As crianças do Sapê totalizam quase 20% da população da favela – 20 mil habitantes.

A preservação ambiental também subiu as ladeiras da favela. Centenas de mudas de espécies nativas da Mata Atlântica, enviadas pelas prefeitura, estão recompondo a floresta que rodeia o morro. O plantio é feito por moradores. A associação, que está caçando pediatra-voluntário, gostaria de tirar do papel programas de atendimento à terceira idade e à saúde da família, rádio e correio comunitários e oficina de informática.

As metas do milênio cantadas pela Portela também vão ganhar o mundo. O 'bloco' da ONU, em Brasília, vai traduzir o samba da Azul-e-Branco para vários idiomas. O pedido partiu da presidência da República, durante a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Portelão semana passada. “Não queremos apenas traduzir, mas criar versões para diferentes idiomas, mantendo a empolgação e calor do samba”, adianta Marielza Oliveira, coordenadora da parceira entre a ONU e a escola.

Dignidade é o enredo principal

Perto dali do Sapê, outra lição. No Centro Comunitário de Capacitação Profissional Paulo da Portela (CCCP), em Oswaldo Cruz, a dignidade é enredo principal. Lá, posição de destaque exige pé no chão. “Sou portelense e, é claro, estou extremamente orgulhoso. Mas temos que tomar cuidado para que esse desejo não comece e termine em samba”, avalia o historiador Mozart Chalfun, coordenador do espaço auto-sustentável.

A casa oferece alfabetização de adultos, pré-vestibular, acesso à Internet, além de oficinas de música, costura e imobilização ortopédica. As aulas de imobilização são ministradas Walber Muniz Pereira, “ex-vestibulando” do centro. “Não tive uma oportunidade como essa para me tornar especialista”, conta. Todas as atividades do CCCP têm preços populares.

Aluno de Engenharia Civil da Uerj, Leandro Baptista de Oliveira, 27, é outra cria do pré-vestibular do CCCP. Hoje, ele é professor do centro. “É muito bom voltar para mostrar que é possível alcançar objetivos”, resume o universitário, que também passou para Física (Uerj) e Engenharia (UFF), em 2001.

Samba: exemplo de cidadania

O casal Jorge e Jacira Lourenço, 64 e 59 anos, nunca imaginou que os batuques de fim de semana na Adega da Kátia, em Colégio, fossem virar coisa séria. Ano passado, o lanterneiro e a dona-de-casa fundaram o Grêmio Recreativo Unidos da Lata de Lixo, juntando a paixão pelo samba e reaproveitamento de lixo. “Nossa vontade é brincar e conscientizar a comunidade sobre o lixo”, conta Jorge. Mangueirense, ele aprova o enredo que a Portela levará à Sapucaí: “Nada melhor do que o Carnaval do Rio para mostrar a necessidade de se transformar o mundo”.

No Lata de Lixo, reciclagem é sinônimo de luxo. A bandeira da escola, por exemplo, é confeccionada com saco de estopa e cabo de vassoura. Nas fantasias, chapinhas de garrafa ganham status de paetês. Sem falar nos bordados e adornos com tiras de sacos plásticos e garrafas PET. Os ensaios, com bateria de garrafões de água, tampas de panela e baldes, costumam reunir quase 200 pessoas a cada fim de semana. Além de mudar a rotina e a decoração da adega, o batuque da reciclagem vem conquistando vizinhos de Rocha Miranda e Irajá.

Outra meta da ONU: uma saúde melhor

Ex-doméstica desempregada, Sônia Maria de Souza Pontes, 34 anos, circula pelas ruas da Favela Parque Acari, onde mora, com disposição de sobra. Só mesmo assim para dar conta da fartura de problemas do lugar. “Já foi muito pior. Depois que o Favela-Bairro passou por aqui nossa vida melhorou muito”, avalia. Atualmente, Sônia atua como agente comunitária. “Faço de tudo: do papel de advogada ao de psicóloga”, brinca.

Junto com três amigas, Sônia supervisiona o grupo e organiza palestra sobre doenças sexualmente transmissíveis, gravidez na adolescência e planejamento familiar. O programa é parceria entre a ONG Centro Integrado de Estudos e Programas de Desenvolvimento Sustentável e a Prefeitura do Rio. 

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