A VIDA FEZ ELA ASSIM (Jornal Extra - 10/09/2008 )
Teresa Cristina festeja dez anos de carreira e conta que viu o bairro crescer e virar ponto turístico, mas lamenta seu abandono.
Caminhar pela Lapa com Teresa Cristina é como fazer uma radiografia do bairro. A cantora conhece cada pedaço, cumprimenta as pessoas, conta a história da escadaria de azulejos, aponta os problemas, lembra “causos”... E ela não conhece o local tão bem à toa: há exatos dez anos Teresa começava ali sua trajetória artística, cantando no Bar Semente. Mas a comemoração pela primeira década de carreira não tem só sorrisos. A cantora se entristece ao ver que, em todo esse tempo, a Lapa mudou muito artisticamente, mas continua abandonada.
- De 1998 pra cá, a Lapa se tornou um dos maiores cartões-postais do Rio. Hoje, atrai turistas de todas as partes do mundo e gente da cidade toda. Mas continua cheia de criança cheirando cola, sujeira, esgoto a céu aberto, ladrões. Não sei de quem é a culpa, eu só vejo o resultado desse abandono — conta Teresa, que diz que apenas os próprios donos das casas de show locais fazem alguma coisa para manter a ordem ali: — Os Arcos, por exemplo, são imundos. Dá pra imaginar o Cristo Redentor todo sujo?
Mesmo cantando por ali há tanto tempo, o amor pela Lapa não diminui. Com uma carreira consolidada aos 40 anos, com quatro discos lançados, e já tendo feito shows por todo o Brasil e no exterior, Teresa Cristina sabe que o bairro é seu porto seguro:
- Eu sempre volto pra Lapa. No dia seguinte de fazer o Canecão lotado, cantei aqui. Depois de voltar de shows em Buenos Aires, na África do Sul e na Europa, também estava aqui novamente. Isso ajuda a manter os pés no chão — diz Teresa, que canta todas as sextas no Carioca da Gema e todas as quintas no Centro Cultural Carioca: — A noite é cansativa, te expõe muito, mas faz você ser mais humilde e entender os problemas dos outros. Minha maior alegria é ver alguém chegar triste, sem nenhuma vontade de ver o show, e sair dali com um sorriso no rosto.
Essa humildade vem da infância. Criada na Vila da Penha com cinco irmãos, filha de feirante, Teresa cresceu vendo os vizinhos pedindo tomate em sua casa. E o pai sempre atendia. A pureza da vida do subúrbio ela foi reencontrar anos depois, ao conhecer a Velha Guarda da Portela. Então vistoriadora do Detran, ela estava pesquisando a obra de Candeia, porque queria fazer um show sobre o compositor portelense — Teresa ainda não era cantora, mas mesmo assim queria fazer o tal show. Ela conheceu os bambas portelenses, começou a freqüentar as rodas de samba, a casa de Tia Surica, até que Guaracy 7 Cordas a indicou para cantar no Semente, numa temporada que ele não poderia fazer. Nascia ali a carreira da mais promissora das sambistas da nova geração.
- Eu sou portelense desde pequena, mas ao conhecer a Velha Guarda se abriu um novo mundo para mim. Eles são de um tempo inocente, de fazer música por amor. E o que o Brasil dá em troca para eles? Eles plantaram a semente. A Velha Guarda recebe todo mundo bem. O abraço deles é de verdade.
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