Manacéia, um dos principais compositores da Portela, morto em 1995, é relembrado, com emoção, pela esposa Yolanda de Almeida Andrade, a Dona Neném, e pela filha Áurea Maria de Almeida Andrade.
Palmas para o senhor melodia
Familiares relembram o talento do portelense Manacéia, que, se fosse vivo, teria completado 89 anos
Voltar à década de 40, na trilha musical de Madureira, uma das moradas do samba no subúrbio, é simples como as letras de Manacé José de Andrade. Basta seguir pela Estrada do Portela e entrar na primeira rua à esquerda depois da Clara Nunes, a que abriga a sede da Azul e Branco 21 vezes campeã do carnaval carioca. No quintal do número 58 da antiga Dutra e Melo, a mangueira sob a qual Manacéia compunha já não existe. A história do compositor portelense, morto em 1995 e, agora, homenageado na placa da via, ao contrário, ressurge a cada lembrança da viúva Yolanda de Almeida Andrade, a Dona Neném, de 85 anos. O artista completaria 89 anos no último dia 26.
- Minha mãe comprou este terreno em 1931. Eu tinha 5 anos. O Manacéia morava na outra rua, a Sérgio de Oliveira. Ele veio de Barra do Piraí para Oswaldo Cruz com 4,5 anos. O Nicanor, tio dele, era tesoureiro da Portela e o levava para a escola desde os 6. E lá ficou até os 74, quando faleceu — narra ela, lúcida personagem desta história de amor que passa pelo samba e pela Portela, desde a infância.
Paixão antiga
O irmão de Dona Neném, Lincoln Pereira de Almeida, era amigo de Paulo da Portela, com quem compôs “Conselho”, e de Manacéia, que sempre aparecia por lá para pegar o cavaquinho. Ela começou a desfilar na escola, para onde ia na companhia de Nadir, prima do compositor, aos 14. Mas o namoro dos dois só se deu na idade adulta, quando ele, reservado, já um consagrado autor de sambas enredo, teve coragem de cortejá-la.
- Nos casamos em 1951.
NOS ANOS 70, O SUCESSO
A música de Manacéia só atravessou a fronteira portelense na década de 70. Integrante da Velha Guarda, ele participou do disco “Portela, passado de glória”, produzido por Paulinho da Viola na gravadora RGE, com a música “Quantas lágrimas”. A composição, descoberta e gravada pela cantora Cristina Buarque, se transformou no maior sucesso dele.
Reconhecimento que fez o homem humilde, que se aposentou serralheiro e foi alfabetizado por uma prima, abrir as portas de casa.
- Depois de “Quantas lágrimas”, ele ficou mais sociável e passou a receber amigos em casa — diz Dona Neném.
DEZ ANOS DE SAMBAS NA PORTELA
Dono de linha melódica bem feita e requintada, difícil de ser vencida, Manacéia começou a compor sambas enredo para a Portela em 1942 e o fez por dez anos.
— A melodia dele era muito forte. Teve ocasião em que eu cheguei a ver portelenses como o Chico Santana fazer samba enredo, mas, depois de escutar o do Manacéia, botar no baú e não disputar, dizendo: “Não vou cantar não porque o dele é muito bonito, não dá para disputar”— lembra o compositor Monarco, da geração seguinte à de Manacéia, ídolo de quem se tornou parceiro na Velha Guarda.